Escusa


O Topónimo Escusa

Administrativamente integrada no Concelho de Marvão e pertencente à freguesia de São Salvador da Aramenha, a Escusa é uma povoação cujo nome tem a sua origem por estar escondida, oculta pelos soutos que a cercam, apenas destacando o branco da torre da Igreja.

Uma outra versão se conta, que quando S. Tiago viera com os cristãos perseguir os Mouros a Porto da Espada, ao passar pela Escusa de hoje tivera dito: "Ali se escusa de ir" e daí lhe teria vindo o nome.

As primeiras casas da aldeia teriam surgido no chamado "meio do monte", no largo junto da Igreja de Nossa Senhora da Esperança, que, segundo as Memórias Paroquiais de 1758, tinha noventa e um casal, duzentas e quarenta e três pessoas de comunhão, trinta e cinco menores e setenta e oito inocentes.

De outro facto há também registo, quando em 23 de Fevereiro de 1756, "o vigário de vara e parrocho do Salvador, João Rodrigues Ramillo" escreve ao Marquês de Pombal, a pedido deste, dando conta dos danos provocados pelo terramoto de 1755, no Concelho de Marvão: "... Em outro Domingo se fez outra semelhante festa em acção de graças na igreja de Nossa Senhora da Esperança do monte da Escuza destricto da mesma freguesia e em outro dia outra na igreja de Sam Simmeão do monte do Porto da Espada também do mesmo destricto ...", (estas missas tinham por finalidade agradecer a Deus o facto do terramoto não ter causado danos maiores em pessoas e bens.)

Devido à sua localização, próxima da fronteira e junto à fortaleza de Marvão, a Escusa foi ponto de passagem para factos importantes da nossa história, tais como:

- Em 1762, durante a guerra contra a aliança franco-hispânica, passou pela Escusa o Conde de Lippe, o qual estava encarregue de preparar a defesa da zona fronteiriça entre Campo Maior e Nisa e cujo Quartel-general se situava em Monforte. Na fronteira de Marvão o itinerário a proteger era o que ligava o posto avançado, colocado no sítio da Pitaranha, até Castelo de Vide, passando pela Escusa.

- Na campanha de 1801, contra Espanha, e por ordem do Marechal de Campo Gomes Freire foram colocadas na Escusa, entre outras terras, algumas companhias e batalhões de Infantaria.

- Durante as lutas constitucionais, no dia 20 de Abril de 1828: "...participava o mesmo juiz... que no dia 20 o tenente Joaquim Estácio, primo do prior, saíra da praça com 24 soldados em direcção à próxima aldeia da Escusa, e que, após a sua chegada a este lugar, mandara dar algumas descargas entre vivas e aclamação a D. Miguel."

- Ao deslocar-se de Castelo de Vide para o posto fiscal dos Galegos, onde esteve instalado de 22 a 25 de Março de 1907 para participar em várias caçadas, atravessou El-Rei D. Carlos "...a fértil região de Castelo de Vide, Escusa, passou pelo aprazível prado de Marvão, sob um frondoso túnel de viçosas árvores, até entrar no pitoresco e turístico sítio da Portagem, banhada pelo Rio Sever."

Há também memória de terem havido na Escusa mercados semanais, instituídos por deliberação camarária de 13 de Agosto de 1938, sendo Presidente da Câmara Municipal, o Padre Fortunato da Cruz Diniz e Pequito: "A Câmara Municipal deliberou criar mercados semanais no Porto da Espada e na Escusa, a realizar aos Domingos pelas doze horas." Não se sabe até quando se realizaram.

Terra de muitas adegas, uma história se conta que no tempo das guerras do liberalismo, havia grandes adegas de vinho na Escusa, uma delas na casa das Senhoras "Semedas" (entenda-se Semedo, mas como eram só mulheres, chamavam-lhe "as Semedas") e numa das pelejas entre os partidários de D. Miguel e D. Pedro, os vencedores, para festejarem, abriram as torneiras dos enormes potes de vinho e deixaram correr o vinho pelas ruas em grande abundância.

Facto que marcou vincadamente a Escusa foi sem dúvida a exploração das caleiras, pedreiras de cal branca e preta que se situavam mesmo à saída da aldeia, e que deram alguma prosperidade à terra na altura em que o trabalho das caleiras ainda era rentável, pois para além de empregar a maioria dos homens da terra, a cal tinha muita procura e era vendida por fora, o que dava algum rendimento. Ainda hoje, os habitantes da terra são associados às caleiras, pois quando se fala da Escusa, muitas pessoas ainda ligam os habitantes à terra da cal, conhecidos também pelo seu característico modo de falar.

Outrora próspera, embora com gente pobre, são prova disso as tabernas que, durante os anos 30 e até há poucos anos, existiam na Escusa, uma aldeia tão pequena, e que, apesar dos parcos recursos dos seus habitantes, conseguiam ir tendo clientela, embora às vezes o vender fiado fosse a melhor forma de garantir os clientes, que pagavam no fim do mês, Aliás, muitas vezes o pagamento dos caleiros era feito nas tabernas pelos donos dos fornos, à volta de uma rodada de vinho. Para a venda de vinho era necessária a licença requerida no Governo Civil, assim estabelecimentos para venda de vinho tínhamos: João Bernardo - Prado; Joaquim dos Santos Galacho - Escusa; Graça, Ventura & Irmãos - Escusa; Margarida da Conceição Carrilho - Escusa; Estêvão Garraio Serra Júnior - Escusa; José Barradas - Escusa; Jorge Reia da Silva- Carriçal; Manuel Casimiro Calha - Prado; Bento Moura - Escusa (era também barbeiro e sapateiro e fazia todos os trabalhos na taberna); Joaquim Batista Trindade Guerreiro - Escusa (onde havia uma televisão e para se ver pagavam-se dez tostões, vinham os rapazes dos Alvarrões à Escusa "ver um aparelho em que se viam e se ouviam as pessoas" na Taberna do Ti Batista, à roda do balcão e de uma "manta de vinho"); Miguel Cebolas Folgado (requer licença especial "tipo B" para estabelecimento de venda de café e seus derivados) - Escusa; Manuel Nunes Carrilho - Escusa (também conhecido como o Ti Mané da Fonte, por ter a taberna junto da fonte pública, esta foi uma das tabernas mais "finas" da terra, onde houve a primeira telefonia e o primeiro telefone da Escusa. O proprietário era correspondente do "Século" e do "Diário de Noticias", que eram lidos na taberna, era também a pessoa que recebia o correio antes de ser o Posto na casa do Sr. António Ventura. Aqui na taberna do "Ti Mané da Fonte" as pessoas entregavam as cartas que tinham para enviar e ele metia a correspondência nos sacos dos CTT, que mandava para Castelo de Vide para serem despachadas); Joaquim Curado da Silva - Escusa (conhecido como Ti "Joaquim do Jorge", famoso pela sua salsicharia, muito frequentado pelos amigos de Castelo de Vide, que aos Domingos vinham até à Escusa, para beber um copo e comer uma cacholeira ou um chouriço assado no "Joaquim do Jorge"); Manuel dos Santos Botelheiro - Carriçal (Ti "Manel Estriga").

Igreja de Nossa Senhora da Esperança

Embora não se saiba ao certo a data concreta da fundação do templo, com base nas "Memórias Paroquiais de 1758" (J.L. Machado e Sérgio Gorjão - Ibn Maruan, nº 3), na descrição que se faz do "Monte da Escuza", refere-se o seguinte: "... no fundo do monte junto à estrada que vai para a villa de Castelo de Vide huma hermida grande, de que he orago Nossa Senhora da Esperança a qual tem sua capela mayor de aboboda e nella hum altar com seos degraos de cantaria, em o qual está dentro de hum nicho a imagem da Senhora, tem sua sanchristia com porta para a mesma capela, e no arco de alva[r]naria umas grades de pão razas, que fecham a dita capela, há nesta igreja missa todos os dias de preceito, a qual vai celebrar hum capelam a quem pagam os moradores do mesmo monte..."

Ao longo dos tempos a igreja foi alvo de obras de melhoramento, sabendo-se que, em Maio de 1878, foi feita a reedificação da igreja, com a ajuda de esmolas do povo. Assim, em Maio de 1978 assinalou-se o 1º Centenário da Construção da Igreja, com festa religiosa e lanche na Sociedade para todos os presentes.

O templo tem frontaria simples, com ombreiras e verga de granito, encimada por uma janela. A torre, postada à esquerda, quatro fases, apresenta três olhais e está encimada por uma cobertura cónica. Tem uma só nave com vários altares laterais, assinalando-se a valia do altar-mor em talha dourada, policromado no estilo barroco. A imagem da Nossa Senhora é policromada e tem valor artístico, numa das paredes laterais existe também um painel com cinco pinturas (séc. XVI). Numa sala junto à sacristia, está instalado o Museu da Igreja, no qual estão expostos paramentos, santos, missais e demais objectos que já não estão a servir no dia a dia. Também pela sacristia se tem acesso à Casa Mortuária.

Terá sido devido às esmolas dadas pelo povo, aquando da reconstrução da igreja, que as festas se fazem em honra de Santo António, pois conta-se que as mulheres terão feito a sua doação por devoção a Nossa Senhora da Esperança e os homens por devoção ao Santo António. Para além disto e pelo facto de normalmente serem os homens a organizar as festas, teriam a partir de então começado a ser celebradas em honra de Santo António.

Para além das festas de Santo António, outras haveria na aldeia, no principio do século, e das quais não temos testemunhos mais concretos, mas principalmente festas religiosas, devido à grande fé das pessoas da Escusa, terra de muitos sacerdotes e religiosas, que consagraram a sua vida em prol das vocações da igreja católica, não só na Escusa mas noutras terras também. Aqui fica o nome dos sacerdotes naturais da Escusa: Monsenhor Manuel Cebolas Folgado, Manuel Tavares Folgado, Alberto Ramiro Reia, Joaquim Ramiro Picado Reia, Manuel Ramiro Reia, Francisco Ramilo Marques, António Ramiro Salgueiro, Emílio Ramiro Andrade Salgueiro, Manuel Augusto Andrade Santa Cruz, Fortunato da Piedade Andrade Santa Cruz, Manuel Carrilho Bugalho.

Julgamos também que se faziam as comunhões, como testemunha a fotografia que possuímos, sem data, e que seria de uma primeira comunhão, pelo traje da meninas, vestidas de branco, com as grinaldas na cabeça, e os meninos com fato completo e com a fita no braço esquerdo.

O Apostolado da Oração

O Apostolado da Oração é uma organização da Igreja, com associados, que trimestralmente recebem uma folhinha com as intenções do Santo Padre para cada mês do ano, as intenções de cada dia e a intenção missionária dedicada a cada mês.

O Apostolado da Oração tem fortes raízes na Escusa e foi instituído na nossa igreja, possivelmente, há mais de cem anos por pessoas ligadas à religião e muito católicas.

Do Apostolado pode ser sócio quem quiser e a intenção principal é rezar, sozinhos ou em conjunto. Nas folhas do Apostolado vem uma oração que se deve rezar todos os dias, cada um por si.

Os associados não pagam nenhuma quota, mas, no final de cada ano, cada um dá em dinheiro aquilo que quiser e que puder, que é enviado para o secretariado do Apostolado a nível nacional, para ajudar nas despesas com a impressão das orações.

Esta organização católica tem várias zeladoras; são as pessoas que arranjam um grupo de pessoas para sócias e que com elas rezam, sendo as responsáveis pela sua orientação.

Na Escusa, o Apostolado da Oração tem uma bandeira, que, sempre que morre algum dos associados, vai no funeral, à frente do carro funerário e do Senhor Padre e é transportada pela zeladora da pessoa falecida. Outro pormenor na Escusa é que os sócios falecidos do Apostolado têm direito a uma missa celebrada por sua intenção sempre na primeira sexta-feira de cada mês, paga por esta organização.

Mensalmente a Igreja da Escusa recebe o livro: "O Mensageiro", que pertence ao Apostolado e que os sócios podem levar para casa para ler.

O Sagrado Lausperene

O Sagrado Lausperene é a adoração do Santíssimo Sacramento, na Igreja, durante a Quaresma, 15 dias antes da Páscoa.

Há muitos anos atrás e porque havia bastante gente da Escusa a frequentar a igreja, a adoração do Santíssimo, que estava exposto no altar, tinha muita devoção e inclusivamente era adorado durante toda a noite, por um grupo de homens que ficavam na igreja com o Senhor Padre (Pe. José Maria), as mulheres só ficavam até à meia-noite, (durante a noite os homens que quisessem podiam-se confessar).

De manhã voltavam à igreja e iam-se revezando, "pois o Santíssimo não podia ficar sozinho".

A adoração faz-se rezando e noutros períodos em silêncio. Termina à tarde, recolhe-se o Santíssimo e celebra-se missa, já com o Santíssimo guardado no altar.

Actualmente, porque há menos pessoas e porque deixou de haver homens que ficassem durante a noite na igreja, a exposição do Santíssimo faz-se apenas algumas horas, começando de manhã e terminando à tarde.

Chocalhada

Numa época em que não era muito comum viúvos e viúvas voltarem a casar, quando o faziam isso era motivo de chacota pelos outros. Assim, na Escusa, homens e rapazes iam à porta dessas pessoas tocar chocalhos, ou seja, fazer a chocalhada. Esta fazia-se também quando uma mulher era abandonada pelo marido.

Lume de Natal

Na Escusa, há alguns anos atrás, era costume na noite de 31 de Janeiro, a "noite velha", antes da meia-noite juntar-se um grupo de rapazes e raparigas, que ia de porta em porta buscar os craveiros das flores das pessoas e colocá-los no meio do monte (largo por cima da Igreja). Iam-se também buscar algumas carroças, que estavam fáceis de trazer, e à meia-noite batiam-se panelas e latas para fazer barulho e festejar a chegada de um novo ano. É evidente que esta brincadeira por vezes não era muito bem aceite por algumas pessoas, pois com o carregar às escondidas os vasos das flores, às vezes alguns caíam estatelados no chão. No dia seguinte de manhã, é claro que cada pessoa procurava o que lhe pertencia.

Santos Populares

Na Escusa tinham lugar na Casa Nova, onde fica localizada a capela de S. João missa e festa a 24 de Junho no próprio local, com a tradicional fogueira dos santos populares. Esta igreja está anexa ao edifício que se diz ter sido um Convento da Ordem de Malta. Já há alguns anos que esta capela, onde está a imagem de S. João Baptista, não está afecta ao culto.

Lenda do Cabeço da Urra

Bem ao jeito da literatura popular, ao tentarmos apurar esta lenda, surgiram-nos duas versões:

Segundo a senhora Maria Almeida Camejo, o local onde hoje se encontra esta fonte, outrora, teria sido ponto de encontro entre uma Moura e o seu namorado.

Na versão do senhor Manuel Farias, nesse local aparecia no ar uma mulher às gargalhadas, que tinha por hábito dar orelhadas e que era conhecida por ter as mãos muito frias.

Lenda da Silva Negra

Conta-se que pelos anos da Peste Negra, em que as muralhas de Marvão já tinham sido restauradas por D. Dinis, houve necessidade de abrir caminhos e veredas para facilitar o acesso ao caminho romano, até ao Vale do Alcaide (Calçada de Marvão - Escusa).

Como Marvão era uma prisão, todos os que para lá iam eram prisioneiros e como Marvão era a primeira linha, por vezes não sustinha convenientemente os ataques castelhanos, o que obrigava o Alcaide de Castelo de Vide a segurar as tropas que ainda passariam. Por tudo isto, houve um acordo entre o Alcaide de Marvão e o Alcaide de Castelo de Vide para que se fizessem os tais caminhos, e assim se transmitissem todas as informações necessárias.

Iniciou então Castelo de Vide o caminho do Prado Inglês até ao "Vale do Monte", aí cessaram sua obra que foi continuada pelo Alcaide de Marvão. Quando começaram a obra, e passado mais ou menos meia légua, antes de chegar à calçada romana, deparou-se-lhes uma enorme "árvore" em que cada ramo que caía ao chão tinha o tamanho do pulso de um homem. Levaram dias para cortar tal árvore e seus ramos, e porque parecia uma silva, chamaram ao local "Silva Negra", hoje aldeia da Escusa.

Quando terminaram o corte, viram então a calçada romana que ainda hoje leva ao Vale do Alcaide, e por continuidade às calçadas de Marvão. E de tal maneira se criou a Lenda da Silva Negra, que os viajantes das redondezas ao se cruzarem diziam:

- Para onde vais?

- Vou para Marvão.

- Por onde vais?

- Vou pelo Monte até à calçada.

- Por aí escusas de ir, porque a Silva Negra abarca outra vez todo o caminho.

- Por onde iremos?

- Ide pela vereda do "Castanheiro Novo" (hoje Casa Nova), pois por aí tendes sombras e fontes onde descansar, e andando duas ou três braças, encontrareis uma vereda que vos levará à calçada, passando assim sem tocar nem olhar na "Silva Negra".

E de tantos caminheiros e viajantes não passarem o monte, ao falarem uns com os outros diziam: "Escusam de lá ir. E Monte da Escusa lhe chamaram.

Assim termina a Lenda da Silva Negra, mas para além desta, outra história se conta também acerca da Escusa, e diz assim:

Há muitos anos atrás era a aldeia da Escusa e arredores um grande souto de castinçais, bravos e mansos, que faziam a delícia de quem passava, pois os seus frutos, a sua sombra e boas águas, obrigavam ao descanso.

Quando na altura dos descobrimentos, D. Henrique, o Navegador, ensaiava as primeiras caravelas, viu que lhe faltava madeira para fazer os seus acabamentos. Foram então consultados os nobres do reino para que informassem se havia tais madeiras nos seus limites. Ao que o nobre de Marvão respondeu que tinha muita vara de castanho, com as quais se podiam fazer boas obras. Mais tarde, vieram para esta região diversos guardiões, artesãos e técnicos da corte para a execução do trabalho.

E porque eram muitos e o trabalho longo, mandou o Rei dizer ao nobre de Marvão que se fizessem casa de pedra, com cobertura de telhas da época. Assim foram feitas as primeiras casas do "Monte da Escusa".